Intransitivando: março 2014

Entre danças,
o passo teme

Mudo,
o passo dança

Tremendo,
o passo anseia
se possuo o posso
de um passarinho

Sobre o intransitivando

Acredito que somos transitivos na maior parte do tempo. Passageiros, deslizamos nas vidas de umas a outras pessoas; efêmeros. Quis eu ficar em algum lugar. Descansar. Pertencer.

E aí tem aquelas aulas de Português em que a gente aprendeu sobre os verbos intransitivos: os que não necessitam de complemento. Acredito que precisamos de complementos na maior parte do tempo, tão incompletos e vulneráveis. A gente vive se buscando no café, na TV, nos livros, em Chico Buarque, no passeio de bicicleta, no banho de chuva, na risada de alguém, no lanche preferido. Quis eu me bastar.

Intransitivar é a minha maneira de permanecer nas palavras e bastar a mim mesma. De abrir mão da minha condição passageira nas experiências da minha própria vida para me manter ali, no que for vertido em entrelinhas. De me desligar do que eu vivi para me conectar ao que eu gostaria de viver. De não precisar de mais ninguém além de mim mesma nesse encontro com o que eu tiver para despejar. Que seja eu a segurar meu cabelo ao enfiar a cabeça no vaso pra vomitar o que tem me enojado.

O emprego da palavra está em gerúndio precisamente por saber que não posso ser intransitiva: posso me abster do passageiro mas também momentaneamente; posso ser suficiente para mim apenas provisoriamente. Intransitivar é temporário, é assim: in-tran-si-ti-van-do e pronto, passou. É por isso também a descrição do blog: "Estaciono. Em algum lugar, estaciono. Entre a transitividade da vida, e para além do que sei, aqui me encontro - e, de algum modo, estaciono." E quem estaciona logo precisa se mover e ceder o lugar para o próximo veículo, porém apenas depois de ter esclarecido o que tinha de resolver.

Intransitivando

quarta-feira, 5 de março de 2014

Mudas danças