sábado, 13 de dezembro de 2008

Companhia


Pegue minha mão. Está na hora de mergulhar no imensurável oceano do desconhecido. E não importa mais se será fácil ou doloroso, desde que seja com você, será o melhor. Agarre-se em meus dedos e segure-se enquanto puder. Não vá, fique. Agarre-se a mim, agarre-se ao nosso ser.

Eu te amo em cada singelo detalhe e nada do que possa acontecer futuramente mudará nem uma parte do que sinto aqui dentro – tão forte, tão verdadeiramente.

Abrace-me e venha sentir a brisa em nossas faces desconsertadas. Vamos contemplar a visão da lua brilhante que nos encara tão serenamente. Temos de caminhar. Seguir nosso destino e rezar por nosso bem-estar.

O que eu realmente preciso é você comigo. E mesmo que não seja a todo o tempo, em meu coração não deixarás de ficar um só segundo.

Apenas abrace-me e mantenha-se em silêncio. Nossos olhares nos dizem tudo o que não cansamos de repetir. O meu coração jamais se calará diante de você.

Não me deixes. Eu sempre te levarei comigo.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Let It Be


Chegou e caminhou direto ao banheiro, deixando em seu caminho a pequena bolsa que levava pendurada no ombro esquerdo. Trancou a porta e começou a tirar a roupa. Tirou tudo o que vestia, deixou apenas a roupa íntima inferior. E as lágrimas vieram, mas vieram como nunca antes. Exageradamente apressadas e apressadamente exageradas. Em ritmo veloz e irrefutável. Ela abraçou as lágrimas como abraçaria a um amigo.

Deitou-se no chão enquanto pensava em tudo o que a havia levado àquele estado, tudo o que vinha acontecendo em sua vida e não lhe deram um por que. Ela nem ao menos soubera o que havia feito de tão absurdamente ruim para merecer tamanho buraco em seu peito.

As lágrimas não paravam, vinham mais e mais aceleradas. Ela apertava os olhos na tentativa de enxergar algo, mas tudo o que podia ver era a água doce que escorria dos seus olhos e deslizavam até seus lábios, desmanchando-se ali.

Eram doces. Sim, eram. Incrivelmente doces. Incrivelmente dolorosas e saborosas.
Abraçou seu próprio corpo e sentiu como se fosse a única com o desejo de fazê-lo. A única que realmente se importava com ela mesma. A única que faria de tudo por tudo. Afinal, alguém deveria mesmo se sacrificar por ela? Será que por que ela amava e protegia aos que amava com tudo o que podia significava que também deveriam fazer isso por ela? Será que era hipocrisia demais que ela pensasse assim? Ou seria naturalmente perdoável, considerando a humanidade daquela garota?

Ela nunca saberia responder. A única coisa que sabia é que ela realmente queria isso – queria que se sacrificassem por ela, que provassem afeto e a protegessem como se fosse a única na vida de alguém -, e não se importava de verdade se isso era certo ou errado. Não havia escolha, tomando sinceridade.

O desejo mais súbito e ridículo que lhe surgiu em vida aparecera. Tratou de apertar as mãos com toda a força que pôde, na tentativa maluca de fazer com que suas unhas entrassem fundo o suficiente em sua carne para fazê-la sangrar, fazê-la sentir dor maior que a que invadia seu peito constantemente – e com mais força agora.

Depois de usada toda a sua força, olhou para as próprias mãos. Nenhum estrago real havia sido feito. As marcas de suas unhas estavam fincadas na pele de suas mãos, mas não era nada que não sairia um pouco depois – nada que abafasse a sua dor.

A inércia tomou conta de seu corpo. E as lágrimas saíram ainda mais rápidas e intensas do que é possível imaginar. A raiva invadiu cada brecha de vida ali existente, cada organela de cada célula de cada parte do seu corpo. E ela começou a arranhar, tentando arrancar a própria pele do corpo, fazer sangrar, fazer doer. Qualquer dor era melhor que aquela. Qualquer uma.

Foi se arranhando com toda a força que podia. A raiva crescendo a cada segundo que passava. Passou a puxar os próprios cabelos e bater a cabeça no chão. Tentou de todas as maneiras mais malucas que lhe surgiu causar-se dor. Nada adiantou. Nada era forte o suficiente. Nada doía o bastante. Mas ela continuou. Deu gritos abafados e chutou o chão, várias vezes. Deu socos na parede e tapas em seu próprio rosto.
Nada adiantava. Nada lhe doía mais. Nada lhe machucava tanto.

Ela desistiu – ou quase. Deitou-se completamente de novo e pôs-se a derramar mais lágrimas. E chorou, chorou o quanto pôde. E lhe surgiu uma idéia.

Talvez se seu coração parasse de bater, isso não doeria tanto. A morte não lhe parecia tão cruel naquele momento. Parecia uma amiga. A única amiga realmente desejosa de lhe ajudar.

E, sem pensar exatamente no que estava fazendo, levantou-se. Pegou a gilete nas mãos e tremeu. Não sabia como se fazia isso. Não sabia se tinha coragem, mas não quis pensar. Estendeu a gilete ao pulso esquerdo e pressionou com toda a força que conseguiu reunir, que não era muita. Não conseguia movê-la. Apenas deixou-a escorregar pelo seu pulso fazendo um corte leve, que não parecia querer sangrar. Então ela sentiu a dor. Era o que ela queria: a dor.

Não se sabe se ela sempre soube que não teria coragem de fazer isso, nem mesmo ela sabe. Mas ela ainda estava chorando. E não era pelo corte em sua mão, ainda era a dor no peito. Pensou mais uma vez em tirar sua própria vida, aquela que lhe fora dado de bom grado, sem que fosse desejada. Ela ainda tinha toda essa inocuidade. Ainda tinha tanto para descobrir e viver. E, apesar de tudo, havia alguns que lhe amavam e que realmente se sacrificariam por ela. Então, deveria ela se sacrificar por quem não faria o mesmo?

Segurou a gilete com mais força e decidiu apenas fazer sangrar, fazer doer. E pressionou com mais força, dessa vez não tremia. Apenas pressionou e arrastou para o lado, sentindo as lâminas cortarem sua pele. Quando viu, começou a sangrar. Nada de mais, mas ela viu sangue. E talvez tenha gostado da dor, porque tentou novamente. E o sangue saiu mais uma vez, a dor apertou um pouco mais.

A dor ainda não era bastante. Nada comparada à sua real dor. Mas ela queria esse masoquismo agora. Estava gostando da dor irritante ardendo em seu braço, fazendo-a se preocupar menos com uma dor maior. Cortou-se mais algumas vezes, quem sabe por diversão – uma diversão sombria, na verdade.

Levantou-se. Ainda com lágrimas no rosto. Olhou-se no espelho e viu a figura mais deplorável. Não era a feiúra, os cabelos despenteados ou os olhos inchados, era o estado de espírito. O estado de espírito mais deplorável que já vira, em descrente decadência.

Sentiu nojo de si mesma. Vontade de cuspir na figura que lhe olhava bem em frente. E tapeou-se, repetindo a ação depois. E chorou mais.

Após um longo momento contemplando a própria figura no espelho, tocou as próprias feridas externas. O sangue já estava seco, petrificado ali sobre os seus cortes. Beijou a própria mão e disse:

- És meu sangue. Minha vontade de viver agora. Não pare de correr pelas minhas veias – e as lágrimas vieram novamente, deslizando sobre sua face já ensopada e avermelhada -, preciso de você.

Tomou um banho quente e rápido e, dando de ombros, decidiu ir viver...

sábado, 22 de novembro de 2008

Gritos de Esperança


Continuo gritando por dentro. O mais alto dos gritos, o mais audível para as almas. Uma alma gritante, é a minha. E se quiser saber o motivo de tanto barulho, não me pergunte. Apenas venha calar aquilo que não queres ouvir. Apenas venha tapar os buracos que estão vazios. Venha preencher o que me falta, aquilo que você deixou alterar.

Não, não demore, por favor. Sabe o que eu acho? Que todo o tempo do mundo pode ser tempo demais para quem espera. E eu ainda estou esperando. Eu acredito que as pessoas mudam, se elas quiserem. Se você quiser, nós podemos voltar a ser como éramos – apenas felizes. Partes um do outro, partes que se completam.

Eu não gosto de estar sozinha, mas se for a minha única opção, garanto que não vou hesitar. Mas permita-me fazer um último apelo. Deixe-me penetrar no vazio da tua alma e arrancar a sensibilidade aí existente. Eu sei que existe. Por mais bem escondida que esteja, por mais bem disfarçada que permaneça, está aí. Você também tem um coração. Certa vez eu vi lágrimas em seus olhos, e isso talvez prove o bastante.

Se lágrimas são a chave da alma, por que tu te trancas? Eu não minto quando digo que é melhor a liberação das emoções. Na verdade, eu sequer costumo mentir. Minha sinceridade está acima do que eu chamo de possível, então eu gostaria que você acreditasse em mim, nas minhas palavras, no meu pouco senso. Eu adoraria que você me olhasse nos olhos e me pedisse perdão por estarmos errados. Eu juro que compreenderia, eu juro que te responderia.

Olhe só para mim, estou quebrada. Inteiramente quebrada. Já é fato que eu não vivo sem você. Já é fato a falta absurda que você me faz, o quanto eu preciso de você. E mesmo que isso não seja recíproco – e você não sabe o quanto dói -, eu quero você ao meu lado.

Talvez seja egoísmo. Ou humildade. Eu realmente não me preocupo em saber. Pecados ou virtudes não fazem parte das minhas prioridades. Minha prioridade é o amor, é o amar. E de alguma maneira, eu amo você. Não o amor dos amantes nem dos irmãos. Não é fraterno ou apaixonado. Mas é amor. Está aqui e eu sinto. E eu quero. E eu preciso.

Não demore, por favor. Eu ainda estou aqui. Eu sempre ainda estarei aqui. Mas não demore. O coração é sozinho para agüentar demais. Não sou tão forte quanto talvez tenha parecido ser. Então não demore. Venha, me abrace e diga que você ainda está ao meu lado, que ainda é meu amigo, que nós precisamos um do outro e assim permaneceremos. Diga-me aquelas três palavras. Diga-me o que é necessário.

Apenas não demore. Meu coração não está em si de tanta dor.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Imóvel e Intocável



Estou me quebrando lentamente, morrendo lentamente. Você pode me ouvir? Pode ouvir meus pedaços caírem? São apenas meus sentimentos sem sentido. Eles vão se calando cada minuto mais. Estou perdendo completamente os sentidos. Será que isso vai demorar?

Esse que chamam de coração, que quase não vejo, que quase não sinto, invoca algum nome. Muito devagar e quase inaudível. É o teu nome. Não, não o chame. Ele quer ir, deixe-o. Está na hora de acabar-se por si mesma. Deixar que todos os teus pedaços tornem-se lembranças. Deixar que tudo o que você é, ou julga ser, vá embora sem um motivo real. Nada, é o que sinto. Mas não há mais nada a se fazer sobre esse desfazimento de humanidade própria. Desfazimento de princípios e certezas. Sobrou-me apenas a loucura. A loucura para, junto com o meu nada, governar o meu ser. Ou o meu não-ser.

Mudanças... Não estavam previstas.

Espere um pouco. Apenas o suficiente para que eu me acostume com a idéia de acabar com isso. Tudo à minha volta mais me parece um nada. Estou morrendo, e você só me assiste cair aos poucos. Está tudo bem, eu vou esperar para vê-lo novamente.

Desejos que habitam minha mente provam que nada mais faria sentido se senso houvesse. Então eu esqueço das minhas vontades e me preparo para as mudanças. As mudanças ou a morte. Acho que vou optar por não optar. Escolher a não-escolha.

Estou indo por esse caminho aqui, mais leve, ainda que de mesmo peso. Eu vou seguir. E vou morrer, um dia. Mas nada vai me impedir de catar os meus pedaços no chão.

domingo, 5 de outubro de 2008

Dolorosa Espera


Eu poderia ir ao seu encontro agora, se já não fosse tão tarde. E pensando melhor deve ser claramente doloroso conhecer você assim tão jovem como sou. Há tanta vida pela frente e eu sequer sei o que esperar.

Mas sempre que me deparo com os meus próprios reflexos não há nada que represente uma pessoa completa – não é como se eu não precisasse de você, mesmo jovem. Eu também sou jovem para estar assim tão cheia de vazios. Mesmo que isso não pareça fazer sentido, eu estou sentindo mais do deveria. De qualquer forma, não é como se realmente fizesse sentido. De fato não faz.

Eu posso observar através dessa lua tão gigante e minúscula aqui na minha janela, tão bem recortada e colada diante desse papelão azul chamado céu, que nada faz sentido enquanto você procura respostas. Eu não estou desesperada por elas, não desesperada. Mas estou mesmo curiosa. Realmente desejosa.

Não vejo como possibilidade viver sem entender, mesmo que seja assim como eu vivo. Nunca entendi nada, e ainda assim procuro respostas. Em vão, é. Mas eu vou continuar procurando-as, ao menos me ocupo durante a minha busca por você.

Estive tão ansiosa para encontrá-lo. Gostaria que entendesse. Não sou assim tão sozinha quanto pareço, realmente tenho companhia. Porém eu quero a sua, você entenderia? Estou faminta por você. Isso não deveria ser um problema, mas é. Eu posso ver em meus olhos o tamanho deste problema que cresce gradativamente à medida que meu coração se aperta.

Definitivamente eu nunca fui muito observadora. Mas isso é notório. Atravessa-me tão vastamente que eu quase não consigo sentir, pelo exagerado espaço que ocupa. Penetra em cada célula que insiste em trabalhar no meu corpo. E mesmo que eu esteja observando a lua tão claramente, isso não parece me acalmar. Não verdadeiramente.

Ainda que com esse desejo profundo de te ver, conhecer teus olhos e tua forma, saber o que se sente ao te tocar... eu sei que posso esperar. Será realmente difícil, mas eu sou capaz – pelo menos disso.

Eu tenho essa esperança especialmente quando observo a lua – tão descuidadamente quanto somente eu consigo fazer. Mas ela me sorri, então nada mais importa. A lua sorri para mim por saber exatamente o que estou sentindo. E ela, colada ali, presa àquela estampa azulada, conhece em cada detalhe a eternidade. E é dela que nós tratamos agora.

Presa ali, a lua consegue ver tudo o que eu sinto. Consegue sentir comigo cada batida ritmada do meu coração. Pode claramente ler meus pensamentos como se fossem um simples folheto em que se trata de algum assunto banal. Afinal, meus sentimentos são todos banais e é deles que meus pensamentos são feitos.

Parada aqui, observando a lua colada ali, posso te sentir por aí. Tão profundamente, tão inutilmente, sinto você. Sei que posso te esperar. Essa espera não será agradável, mas é precisa.

Então eu olho para a lua e digo a ela, sem necessariamente pronunciar as palavras, que te avise o quanto te espero e a desnecessidade de pressa. É engraçado o poder do destino, e vou deixá-lo ser poderoso sem me tornar impaciente. Serei grata por tudo o que ele me fará, enquanto relato à lua meus banais sentimentos.

Estarei te esperando, até a última brecha de esperança que restar em mim. Mas não se esqueça de vir. A esperança pode ser a última a morrer, mas isso não a torna imortal. Eu estarei esperando e sei que você virá. Talvez falte muito, ou só o suficiente. Mas você virá.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Pólos Opostos


O norte e o sul deveriam ser meus limites, mas eu estou totalmente ilimitada. Sorrisos não me surpreendem, olhares já não me agradam. Estou apenas esquecendo e modificando tudo aquilo que poderia ser verdadeiro.
Já não sou mais, não espero mais, não vejo mais. Vivo me ignorando enquanto o norte e o sul me aguardam desesperadamente.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Incoerente


Se palavras pudessem explicar o que aqui dentro é tão cristalino, talvez pudéssemos cantar uma canção. Nesse deserto absurdamente gelado onde o tudo nunca foi mais que o nada. E de repente, palavras surgidas de um turbilhão de emoções passadas não passam de meras lembranças vagamente remotas de um passado que de fato se foi.

Se ao menos pudéssemos entender o que nos aconteceu no passado, e no mínimo subentender o que nos virá no futuro. Se ao menos tivéssemos essas poucas certezas, teríamos um bom presente. Mas o que temos em mãos agora não se faz suficiente.

A curiosidade é infinita e crucial para aqueles que não possuem respostas. Mas o tempo sempre levará o que, por vezes, insiste em ficar. Não há como evitar. Torna-se inútil agonizar ou opor-se a tal fato. Só nos resta perceber que nada foi em vão. Só me resta contar os dias para essa profunda mudança, antes que eu me esqueça como são os números.

Eu quero te falar, mas eu não tenho como. Como se todo esse frio me congelasse por dentro, congelasse as palavras que possivelmente sairiam se lhes fossem concebidas essa permissão.

É por isso que eu aprecio o céu desta noite. Para encontrar nele as palavras que se perderam aqui dentro. As explicações que em mim estão ausentes, os motivos que não consigo enxergar nessa escuridão. Algum dia talvez a luz se acenda. E quando isso acontecer, pode ser tarde. Talvez eu já tenha mergulhado profundamente demais nessa falta de luz e a prefira a ter as coisas esclarescidas. Mas por enquanto é isso o que vou buscar, é isso que vou temer.

Eu ainda acredito na sinceridade, e eu vou morrer buscando isso, temendo isso.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

With Your Eyes


Do you know what the clock mark right now?
I don’t know too.
This not really cares, is it?
‘Cause I’ve been thinking of not care
About nothing else
If the moon shines in the sky,
I think that I can shine here too.
With your eyes,
Shine with these huge ardent flames in your eyes.
We’ll be then:
the moon and the sun.
Would you like to be my sun?
‘Cause I’d love to serve your ardent wishes,
Your deep love.
It’s for this that the moon exists:
To calm the sun
Tired of shines.
But don’t worry about this.
I won’t let it happens.
I won’t let you delete your flame
And I won’t let you feel tired of shine.
It’s your shine that brings me to life.
Your penetrating and amazing look

Tells me what the life is.

‘Cause your eyes are the size of the moon.

Tradução

Você sabe que horas são?
Eu também não.
Isso realmente não importa, importa?
Porque eu estive pensando em não me importar.
Sobre mais nada.
Se a lua brilha no céu,
creio que posso brilhar aqui também.
Juntamente com os teus olhos,
com essas imensas chamas ardentes nos teus olhos.
Seremos assim, o sol e a lua.
Você gostaria de ser o meu sol?
Pois eu adoraria servir teus desejos ardentes,
tua profunda paixão.
É para isso que a lua serve:
acalmar o sol já cansado de brilhar.
Mas não se preocupe com isso.
Não deixarei que isso aconteça.
Não deixarei que apagues tua chama
E não deixarei que se canses de brilhar.
É teu brilho que me invoca à vida.
O teu olhar penetrante e incrível
que me diz o que é a vida.
Porque seus olhos são do tamanho da lua.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Frases Inacabadas, Felicidades Interrompidas

Era uma noite fria e levemente nublada, seus cabelos longos e loiros esvoaçavam com o vento, enquanto seguia com passos lentos e curtos, em direção à sua casa. Tinha um ar de decepção no seu rosto que qualquer um, até mesmo os menos observadores, notaria. Porém ninguém havia para notá-la. A rua estava absolutamente deserta, ouvia-se apenas o farfalhar das folhas dependuradas das árvores.

Sentindo que não aguentaria chegar ao seu destino, sentou-se sob uma árvore e depôs-se a pensar em toda a sua vida. Lembrou-se de como seu pai a deixou de maneira tão trágica, e como a sua mãe ignorava o fato de sua existência diariamente quando levantava-se e ganhava o mundo, voltando para casa altas horas da madrugada.

Ficou imaginando como seria sua vida se seu pai ainda estivesse ali, acolhendo-a. Mostrando-a como a vida poderia ser bela se a tornássemos. Recitando-lhe lindos versos de seus poetas mais apreciados, que carregavam ótimas lições. Ou quem sabe até caminhando junto com o seu vazio, e tentando preenche-lo.

Ele havia ido embora. Ele e o único homem da sua vida. Um para sempre, outro para nunca mais. Um a abandonou sem querer, outro a deixara sem razão. Acabara de dizer que ainda a amava, mas que porém tinha desejos diferentes dos seus. Mentira. Se a amasse, não a deixaria assim, acabando-se por si mesma, sozinha e sem consolo.

Tornou a lembrar-se do pai. Quanto tempo havia que tinha ido? Uns três anos? Mas o cheiro de tabaco que continha em si constantemente ainda penetrava suas narinas, assim como o desejo de ter aqueles abraços fortes e confortantes envoltos de seu pescoço continuava a invadi-la. Gostaria de só mais uma vez conversar com seu pai, ter um momento feliz onde ele a ensinaria como enfrentar situações como essa. Gostaria de estar com o seu pai naquele momento, para que ele enfim a pudesse fazer sorrir, como só ele conseguia.

Ali, recostada na árvore, permaneceu, e fechou seus olhos, como se isso pudesse amenizar seu desejo tão imediato e torturante.

Ela estava sentada na grama verde-escura observando as cores das flores quando um senhor de idade vestindo uma jaqueta de jeans preto sentou-se ao seu lado e pediu-lhe para acender um cigarro.

- Poderia? – disse-lhe, estendendo o cigarro.

- Claro – respondeu, sorrindo. – Aqui está.

- Desculpe incomodar, é que eu sempre me atrapalho com esses isqueiros – retrucou, dando uma gargalhada rouca.

Ela não podia acreditar. Conhecia alguém que também odiava isqueiros. Alguém com aquela mesma gargalhada rouca, e que usava uma jaqueta de jeans preto exatamente como aquela.

- Pai? – perguntou, com toda certeza da resposta, só por perguntar, esboçando um enorme e repentino sorriso. – Ah pai, você veio!

- Achava mesmo que alguma vez eu te deixaria na mão? – indagou, ao mesmo tempo que respondia ao abraço que a garota lhe despejava. – Minha querida, o que está acontecendo, hein?

- Pai, ele... – não terminara a frase, fora interrompida pelo próprio pai, que agora dava outra gargalhada rouca.

- Mas o que eu estou dizendo? Claro que eu sei o que aconteceu! Ah, minha querida, eu sinto muito mesmo. Sabe, eu conheço aquele rapaz. Ele realmente te ama. Vai voltar.

- Eu acho que não, pai – as lágrimas amontoaram-se em seus olhos, prontas para sair.

- Opa, nada de chorar! Estou com você, não é? Vamos lá, cante para mim.

- Pai! Eu não vou cantar.

- Como é que é? Vai desobedecer ao seu pai? Vamos, cante!

- Qual é, pai? Eu não canto há anos, desde que você se foi e...

- Quem disse que eu me fui? Ora, que conversa maluca. Se eu tivesse ido, não estaria conversando com você, não é mesmo? Agora deixe de enrolar e comece a cantar.

Após uma pausa, percebeu que não tinha nada a perder cantando para o seu pai. Era tudo o que ela queria. Estar ali com ele, e ainda fazendo a coisa que mais gostava.

- Manhã de sol, e nada mais a fazer... além de contemplar você... sorrir enquanto observo... teu belo rosto durante o sono...

- E sinto que nada mais...

- Me faria tão feliz... se não um beijo teu...

- CALE MEUS DESEJOS, OH QUERIDA!

Os dois gargalharam.

- Pai, gostaria de te repetir uma coisa.

- À vontade, OH QUERIDA!

- Sabe, você não é um bom compositor.

- Sabemos, filha, sabemos – sorriram, mais uma vez.

Passado um momento, a filha notou que o sol já começava a se pôr.

- Pai, preciso te perguntar uma coisa.

- O que quiser, meu amor.

- Se você não se foi, se está aqui... Quero dizer... Como sabia o que estava acontecendo? Como que... como que você não se foi?

- Depende do que é ir para você – soltou essa, e permaneceu em silêncio. A garota não parecia querer falar, então o pai tomou a palavra. – Você ainda não entendeu? Eu posso ter ido, mas não fui para você. Tudo isso que está acontecendo agora, está acontecendo apenas para você. Eu estou no seu coração, portanto não fui embora e sei o que você está sentindo.

- Obrigada, pai. Por permanecer em mim.

- Eu que agradeço, filha. Se você não quisesse, eu não permaneceria.

Ao sentir algo lhe envolvendo, a garota despertou do sonho que acabara de presenciar. E ao abrir seus olhos, viu a ele.

- O que está fazendo aqui? – disse, levantando-se do chão da árvore, disfarçando as lágrimas e o cochilo que acabara de ter, deixando que o casaco que acabara de ser colocado sobre ela caísse.

- Você está mesmo perguntando isso? Não achava mesmo que eu te deixaria ir embora, achava? – perguntou o rapaz louro e alto, de fisionomia atraente.

- Eu... você que me mandou embora!

- Não te mandei embora! Longe de mim.

- E o que quis dizer com ‘algo vai mudar definitivamente para nós dois, desejamos coisas avessas e precisamos parar para pensar direito’.

- Eu quis dizer que quero me casar com você. Quero viver toda a minha vida ao seu lado, e isso significa responsabilidade. Mesmo que você não aceite, eu te quero e não vou te deixar ir – disse à garota, enquanto acariciava seu rosto pálido e assustado.

- C-c-como assim? Você disse... você disse... casar? Quer casar comigo?

- Imediatamente, se possível.

Ela esbanjou um sorriso de orelha a orelha e pulou nos braços daquele que a amava, cujo coração lhe pertencia. Agora ela tinha dois corações. O seu próprio, e o de seu amado. Mas havia uma coisa apenas que gostaria de fazer.

- Vem comigo? – disse ao rapaz, ainda sorrindo.

- Se for com você, vou a qualquer lugar.

- Mesmo um cemitério?

- Até à lua.

Segurando-o pelo braço, foi correndo em direção a uma rua larga e cheia de buracos. Faltava calçamento, porém ela não parecia se preocupar com as quedas que ocorreriam até o seu local desejado. Estava com ele. E nada poderia lhe impedir.

Viraram à direita duas vezes e enfim seguiram em frente. Ao avistar o cemitério, correu como se tivesse pressa.

Logo já estavam em frente ao local onde seu pai fora sepultado. Virou-se para o rapaz, e disse:

- E então, trouxe as alianças? – sorrindo.

- Claro, mas... você tem certeza que quer aqui? – respondeu o rapaz, fazendo uma pergunta que viria mais cedo ou mais tarde.

- Absoluta – e selou-lhe rapidamente os lábios. – Ele precisa presenciar. Ele mais que qualquer um.

- Muito bem, então, amor – sorriu, estendendo-lhe a aliança dourada e levemente brilhante. – Aceita casar-se comigo, senhora? Prometo amá-la todos os dias da minha vida, que nem a morte nos separe.

- Aceito – e ao dizer esta única palavra, seus olhos foram preenchidos por lágrimas que insistiam em permanecer presas. – Mas e você, caro senhor... – soltaram risos, quando as lágrimas finalmente caíram – aceitaria casar-se com essa pobre moça? Prometo-lhe te amar eternamente, independente de tudo, até mesmo da morte.

- Seria louco se dissesse que não.

Entrelaçaram os dedos agora com alianças, olharam um nos olhos do outro e aproximaram seus rostos, mais perto um do outro a cada segundo. Seus lábios se tocaram demoradamente. E por mais estranho que pareça, ali permaneceram por quase uma hora, no meio da noite em um cemitério, em frente ao sepulcro do falecido pai da garota. Mas eles se amaram como jamais se houve conhecimento.

sábado, 17 de maio de 2008

Valsa Eterna


Conheço muitos conceitos sobre a saudade, mas nenhum melhor do que o que sinto agora. E, francamente, não é fácil. Sei que triste mesmo é a saudade que nunca acaba, daquele alguém que se foi para sempre, que jamais voltará. Mas que posso fazer se essa dor me invade de tal maneira que mal posso ignorá-la?

O tempo está passando, e as coisas estão acontecendo. É tão rápido. Tão devagar. Sinto cada vez mais os meus planos se afastarem do meu horizonte. Que será que estou fazendo de errado?
Olho para você e nada mais enxergo. E mesmo sem olhar para você, nada mais enxergo. Isso pode me levar a sofrer, mas eu não posso evitar. Sinto vontade de você.
E o tempo continua passando. E eu continuo querendo você. E meus planos continuam fugindo. Responda-me apenas uma coisa: você também sente o mesmo? Sua vontade é a mesma? Você também quer a mim?
Porque se assim for, meus planos talvez funcionem. E eu talvez possa sentir um pouco menos a tua falta. Poderias responder logo? Sabe, tenho pressa.
O relógio não pára com seu tic-tac e eu não paro com meus pensamentos. Os meus desejos estão sempre aqui, muito fortes. Não posso esperar.
Queria que você fosse meu, se já não é. E se for, queria que fosse mais meu. Só meu.
Ignorar completamente tudo o que não podemos ignorar. Esconder de vez tudo o que não podemos esconder. E mostrar tudo o que ainda não mostramos. Sim, eu quero isso. O que você me diz?
Vamos lá, a hora está passando. A saudade está aumentando. Mas o telefone não está tocando, você não está me ligando. Nem uma mensagem. Nenhum sinal. Lembras de mim?
Ó como temo por tua resposta. Ó como espero por ela. Venha rápido, não posso esperar sempre.
Meu coração está tão apertado, tão machucado. Porque a saudade o aperta, a saudade o machuca. E você está ajudando-a. Pare com isso. Não está vendo que não gosto?
Tic-tac, tic-tac, tic-tac. Isso está irritando. Relógio, poderias te calar? Obrigada.
Minha cama está desarrumada. Não, não consigo parar de me remexer sobre a mesma. E os meus papéis estão todos jogados no chão, há apenas alguns ao meu lado. Junto ao meu porta-retrato. O nosso porta-retrato. O nosso passado.
Veja, poderemos ter um futuro. Você quer? Diga-me: é isso o que você quer? Compartilhar o seu futuro comigo? Eu posso fazer dele uma eterna brincadeira, uma eterna valsa, uma eterna infância. Basta apenas que me respondas se é isso o que você quer.
Viver eternamente ao meu lado. Dançando nossa própria valsa, nossa própria música, nosso próprio amor e nossa própria juventude.
Não terei vergonha. Não terás manchas vermelhas na pele. Teremos apenas o amor, ele sim será vermelho, ele sim terá vergonha.
Nosso salão será prateado, coberto de pétalas de rosas. Todas cor-de-rosa, ou quase. Haverá algumas vermelhas, destacadas. E nossos pés estarão sempre sobre elas. Dançando. Bailando. De um lado a outro. Do outro a um lado.
Parece-me uma boa idéia que tenha algumas pessoas nos assistindo. Assim não estaremos sozinhos. Teremos platéia.
E a saudade não apertará. Mas o tempo continuará a passar. Passar como nossos passos.
Meu cabelo continuará preso, sob uma coroa de flores. E o seu terno preto continuará pequenino. Que tal parece a idéia para ti?
Se tiveres gostado, podemos torná-la realidade. Uma valsa eterna. Uma valsa romântica. Nossa eterna valsa romântica. Entrarás nessa aventura?

sexta-feira, 18 de abril de 2008

O Destino do Casal Entrelaçado

Os dois estavam abraçados. Era um pequeno banco de praça e já passavam das duas da manhã. Não me pergunte há quanto tempo estavam ali, ou com que freqüência o nariz da garota roçava no pescoço do rapaz. Não me pergunte se eram apaixonados, porque isso você poderá descobrir. Pergunte-me apenas o que eu fazia ali, observando um casal entrelaçado em um banco de praça.

Não, eu não sei. Sei apenas que me atraíram. Era interessante a maneira como o olhar dela brilhava e o dele permanecia tão frio. Imaginei logo que ele estaria pensando em deixá-la. Quase fui perguntar. Não o fiz, óbvio.

Não era uma daquelas moças cheias de beleza. A beleza dela não estava em seu rosto, nem em seu cabelo. Estava no seu olhar profundo. Ela parecia ser daquelas donzelas ingênuas cheias de carinho e romance dentro de si. Cheia de vida.

O rapaz não se equiparava à garota. Tinha um charme incrível, e mostrava-se muito atraente, de verdade. Poderia ser até uma boa pessoa, mas eu não gostei dele. Não gostei pois não parecia nem um pouco grato por ter uma menina tão encantadora ao seu lado.

Sinto-me constrangido em dizer que observei por muito tempo. Nada daquilo tinha a ver comigo, eu era apenas um homem curioso tentando descobrir o destino de uma garotinha singela.

Dois minutos se passaram após a minha análise profunda do rapaz, até que ele falou. A menina pareceu levar um susto, mas sorria.

Aproximei-me. Precisava ouvi-los. Precisava saber o que se passava.

Não havia mais ninguém por ali naquela noite, conseqüentemente não precisei chegar muito perto para ouvir o que diziam.

- Eu sei que você me ama de verdade. Desculpe-me por não te demonstrar o mesmo, sim?

O sorriso da garota desapareceu.

- Então você... você não corresponde?

- Claro que sim. Plenamente. Eu só não sei... só não sei...

- Parece-me que pouco sabes.

Ele a olhou nos olhos. Acho que não havia entendido o que ela queria dizer.

- Eu... amo muito você. Mesmo. Nunca me senti tão bem ao lado de alguém.

- Explique-me sua dúvida, então.

- Será que isso real? Sabe... você, eu... parece um sonho.

- E se for? Sonhos também são vividos.

- Eu não penso dessa maneira – ele se recostou no banco, abaixando a cabeça.

- Estou aqui para mudar isso. Estou aqui te mostrando que o sonho é a realidade, desde que nós o façamos ser.

- Você é boa demais para mim – disse, levantando-se. Pegou seu casaco e foi caminhando.

A garota o observava se afastar. Percebi que ela estava em conflito. Acho que estava pensando se valia ou não ir atrás dele. Ela se decidiu rapidamente, pois logo estava ela correndo em busca de quem amava.

Abraçou-o. Lágrimas caíram dos olhos dela. Não foi diferente com ele.

- Por que você não me deixa ir? Será melhor assim.

- Diga-me: você me ama?

- Claro que sim.

- Imagino, então, que não me queres ver no sofrimento. A partir do momento que me deixares, só dele me restará. Preciso de você.

- Eu não posso querer de você. Não torne isso mais difícil.

A mão da garota foi levemente tocando a face do garoto, acariciando muito atentamente sua bochecha. Sorriram, os dois. E eu também. Ela o beijou. Quase chorei eu mesmo com a emoção da cena.

Ao separar dos corpos, o rapaz voltou a sorrir. De repente, os dois gargalhavam.

- Você sabe que eu nunca vou conseguir te deixar, não é? – disse o rapaz, segurando na cintura da moça.

- Eu sempre soube – e seu sorriso se abriu ainda mais.

Não me pergunte o que aconteceu depois. Deixei que o amor deles fluísse, privativamente. Sem espiões.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Dois Corações, Uma Última Chance



A lua iluminava claramente no céu, fora da janela. Lua cheia. Bela. Encantadora. Talvez tenha sida ela, a lua, que me fez mostrar o que sentia. Impaciente pela tua resposta, o teu silêncio me matando.

- O que me dizes? – tive que perguntar.

O medo preencheu o meu peito quando percebi em sua expressão a dúvida. Não me amas mais, pensei comigo. Meu coração congelou e quis gritar o teu nome, porém permanecerias imóvel ou me chamarias de louca.

Toquei a tua mão. Continuava tão macia e morna como há um mês atrás. Gostei da sensação confortante de sentir teus dedos entre os meus novamente. Já não me apressava mais pela tua resposta.

Levantaste a cabeça e teus olhos penetravam os meus da maneira mais doce que poderia. Eu quis sorrir, de verdade. Perdoe-me por não te-lo feito.

Percebi quando teus lábios se aproximaram dos meus, tão delicadamente. Por dentro, meu corpo inteiro estava inquieto. Porém permanecia imóvel. Fechei meus olhos, acompanhando os teus que faziam esta ação de maneira tão calma como se tivéssemos toda a vida para aquilo.

Nossos lábios selaram. E lentamente nossas línguas começaram a se entrelaçar. Foi um beijo longo e rápido. Longo pelo tempo que levamos. Rápido pelo desejo de não acaba-lo jamais. Intenso sim, com certeza.

Ao nos separarmos, minha mão ainda tocando a tua, esperei por tuas palavras. Parecia que não viriam. Permanecias indiferente ao acontecimento.

Acariciei tua mão levemente, na tentativa de te encorajar com as palavras. Tinha certeza de que querias falar, só não sabias como fazê-lo. Nunca soubeste.
Confortantemente, senti os teus braços me envolverem. Um abraço tão forte e apertado. Pareceu-me que tentavas ter certeza de que era isto o que querias, os meus braços aos teus, os meus lábios aos teus, e o nosso amor assim, todo nosso.

Desvencilhou-se de mim lentamente, e deixei-me fazer o mesmo. Logo, olhando profundamente em meus olhos e com os lábios aparentemente secos e hesitantes, ainda reunindo as palavras que diria, proferiu:

- Eu sempre te amei – vi pela primeira vez uma lágrima cair de teus olhos.

Dessa vez o beijo foi muito mais longo. O abraço muito mais apertado. O desejo ainda mais crescente. E a noite uma criança.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Os Pedaços de um Coração


Meu coração começou a desmanchar tão de repente que não tive tempo suficiente para segurar os pedaços que caiam à minha frente até chegar ao solo. Sentei-me próxima aos pedaços caídos e logo fiquei a observar como cada um se encaixava no outro tão perfeitamente. Porém eu pude notar que havia um pedaço faltando ali, e notei com facilidade pois o pedaço não era, nem que mal observado, pequeno.
Toquei o espaço que estava faltando uma parte de meu coração, e ao fazer isso senti algo no meu peito. Algo como uma dor. Pus a mão sobre o buraco que eu havia acabado de perceber que faltava lá.
Alguma coisa me transpassou pelo corpo de forma inexplicável e sem capacidade de entendimento, mas eu pude sentir que era real. Não era bom, mas era real. Acho que era algum tipo de sentimento me invadindo. Um sentimento desconhecido.
Não me sentia bem com aquilo dentro de mim. Parecia-me com angústia. Ou quem sabe, decepção. Mas eu poderia chamar também de raiva. Era uma incógnita, mas eu não queria decifrar.
Meus olhos fechados. Talvez pela forte dor que me invadiu e tornou como impulso o fechar de meus olhos, talvez porque todos aqueles meus sentimentos pedissem que eu os fechasse. Mas era como se eles permanecessem abertos, porque eu senti uma outra presença naquele local que eu não sabia onde era. Outra pessoa estava ali comigo, eu só não a via.
Fui abrindo os meus olhos não tão facilmente. Havia olhos me observando. Olhos que pareciam não ver, observavam apenas.
Sob aqueles olhos bonitos, havia um belo e cauteloso sorriso. Seja quem fosse que estivesse junto a mim naquele momento, tinha belos olhos e um sorriso encantador.
Quando finalmente pude abrir meus olhos completamente, notei que era uma mulher. Aparentava ter bastante experiência, porém tinha um ar jovem que lhe tornava ainda mais bela. Como se ela já tivesse tido muitas decepções ao longo da vida, mas o fato de estar viva, ter passado por tudo e ainda manter a esperança e a alegria em si tornasse-a uma vencedora.
Fiquei observando por um tempo como ela me contemplava. Sorri também. Em tentativa de passar a ela a mesma segurança que ela estava me fazendo sentir.
Porém esse bem-estar que ela me fez sentir durou pouco. Durou apenas até que eu pudesse notar que ali no chão jazia um coração despedaçado. O meu coração, todo despedaçado.
Logo pude sentir que as lágrimas que eu não derramava havia tempos estavam ali novamente, caindo descompassadamente. Tornaram-se soluços.
A mulher não sorria mais, havia percebido a cena. Certamente percebeu o que eu estava sentindo também, porque de acordo com que meus soluços e lágrimas iam aumentando ela parecia ficar triste.
Ela tocou em minha mão. E ao fazer, despertou-me a vontade de abraçá-la, mesmo sem conhecê-la realmente. Não o fiz. Talvez por medo. Porém acho que não, algo nos separava.
Eu não estava mais chorando. Ainda havia lágrimas que não tinham acabado de escorrer pelo meu rosto, mas o meu desespero não estava mais presente. Quase sorri ao vê-la me observar tão profundamente sem ter nenhuma reação.
Ela soltou a minha mão de leve, após um tempo me observando. Fez um sinal para que eu olhasse para o meu coração ali partido no chão. Só pude fazê-lo porque ela me transmitia segurança. Aquele coração me mostrava o que eu preferia não ver. Coisas boas, que se tornavam ruins por não serem mais presentes em minha vida.
Quando baixei o olhar para um dos pedaços, ele estava sendo reajustado ao outro pedaço partido ao lado. Logo, a mulher tocou em outro pedaço e o arrastou para próximo do que tinha acabado de montar, muito lentamente. Acho que no final ela pretendia junta-lo inteiramente.
Parecia-me uma tentativa em meio ao vão. Um pedaço ali faltava. Um pedaço que eu não sabia sua verdadeira localização nesse momento, porém sabia onde ele estava. Onde deveria estar.
Continuei observando até que ela pôde juntar todos os pedaços. Ainda faltava um pedaço ali. Como ele bateria novamente sem o pedaço que lhe faltava? Não questionei para que ela pudesse ouvir, só para meu próprio pensamento.
Vi quando ela colocou o coração no espaço vazio dentro do meu peito. Toda a dor que eu sentia estava amenizada. Não por completo.
Olhei-a, e antes que pudesse agradecer, ela me disse:
- Este pedaço será reconstituído com o tempo. Não tenha pressa. A vida trata dos nossos vazios de tal maneira que nem nós mesmos faríamos.
Emocionei-me com aquelas palavras. Eram bonitas. Sábias.
Toquei no local em que meu coração havia acabado de ser recolocado por uma desconhecida sábia, e sorri. Abracei-a. Sem medo, dessa vez.
Levantei-me e saí. Agradecendo-a por tudo que havia me feito, apenas em pensamento. Ela só me observava afastar-se, pulando e segurando nas mãos a esperança de que tudo mudaria.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Solitude


A sala estava vazia, exceto pela pequena e doce garotinha sentada no canto. Ela não entendia o mundo, por isso chorava desesperada, procurando respostas para perguntas não-formuladas. Só o que podia sentir era o cheiro de hortelã vindo do lado de fora da porta.
Era um cheiro agradável e atraente. Talvez ela pudesse verificar o que havia por trás daquela porta marrom, com traços antigos e escuros, porém o medo estava ao seu lado. E se encontrasse algo ruim para si? Se houvesse terror por trás daquela porta?
As respostas não vinham. A luz também não. A única brecha de claridade estava distante, no teto acima da porta.
A amável menina agarrou o urso de pelúcia que trazia consigo, deixando cair do pescoço peludo dele o laço cor-de-rosa. Olhou fixamente o laço caído ao chão e soltou o urso, ao mesmo tempo que puxava o laço para perto de seus olhos, analisando seu nó. Talvez o mundo fosse um laço, pensou consigo mesma.
Tão enrolado, porém bem trançado. Confuso. Bonito.
Desatou o nó, na tentativa de desvendar os mistérios do mundo, da vida. Evidentemente não descobriu nada. Não chorava mais, entretanto seus olhos ainda cintilavam as lágrimas derramadas.
Deitou-se encolhida. Sentiu frio, e desejou ter um cobertor próximo ali. Mas a garotinha não o procuraria, havia medo sobre ela. Medo do que mais pudesse haver naquele quartinho escuro.
Logo ela desejou novamente saber o que havia por trás daquela porta. O que havia lá que a fazia ter medo? Ela não sabia, e tinha medo de saber.
Sem perceber, suas mãos se movimentaram. Tocaram sua própria face como se fosse a de um desconhecido. Será que ela mesmo teria se trancado ali ou o mundo a expulsou dele?, pensava consigo.
De súbito, sentou-se. Olhou ao redor, tentando enxergar algo. Agora, o quarto parecia um pouco mais claro, não o suficiente para deixa-la enxergar completamente, sem dúvida alguma.
Fechou os olhos levemente, seu queixo quase tocando o busto. Abriu as mãos e se abraçou fortemente, esperando sentir algo especial. Sorriu, pela primeira vez em muito tempo.
Sua risada ecoou pelo quartinho vazio e sem luz, fazendo-a parar assustada. Quem está aí?, perguntou em voz alta. Ouviu as suas próprias palavras soarem mais algumas vezes. Sentiu-se aterrorizada novamente, pensou no mundo.
Em algum momento ela saberia que mistério havia atrás da porta? Em algum momento lhe mostrariam os segredos da vida? Quais eram esses segredos? Quem os tinha? Por quê tudo vazio?
De repente a resposta para uma de suas perguntas veio à sua cabeça. Ela não descobriria nada se não atravessasse aquela porta. Ela não saberia os segredos que a esperavam do outro lado. Não mataria sua curiosidade se não espantasse o medo. Jamais seria respondida se não buscasse de fato saber as respostas.
Ficou de pé. Ao tentar ir em direção à porta, cambaleou e caiu. Chorou, sentiu suas esperanças se esvaindo. Começou a soluçar, sentindo-se um fracasso, achando-se uma inútil, incapaz. Suas lágrimas cessaram no instante em que o cheirinho de hortelã veio com mais força. Ouviu um barulho mais parecido com melodia.
Sorriu. Dessa vez não teve medo quando sua própria risada ecoou pelo quarto. Agora ele parecia evidentemente mais claro.
Ela caiu, mas e daí? Poderia se levantar, não poderia?
Agora sua vontade de atravessar a porta e descobrir de onde vinha aquele delicioso aroma e a sinfonia melodiosa era muito maior, muito incontrolável.
Levantou, ainda sorrindo. Caminhou até próximo da porta. Quando seus dedos encostaram no trinco da porta, seu coração acelerou. Giraram devagar. Finalmente. Finalmente saberia de tudo. Finalmente suas dúvidas seriam esclarecidas.
Abriu a porta muito lentamente. Uma forte luz veio rapidamente. Seus olhos brilharam, seu sorriso ainda mais abertamente irradiava, seu coração disparado.
Era ali o seu lugar. Era ali a sua felicidade. Era ali o fim do mistério que lhe atormentara tão profundamente. Era ali. O lugar. As respostas.
A luz.