segunda-feira, 7 de abril de 2014

Eu cometi um erro


Eu cometi um erro.

Primeiro, houve a relutância. “Não, mas é porque quando eu me deparo com a situação X, eu reajo de maneira Y! É o meu jeito, não sei ser diferente!”. Eu me defendi de mim mesma. “As pessoas precisam me entender como eu sou!”.

Em seguida, os julgamentos dos conhecidos. Que não sabem muito, mas frequentemente parecem acreditar que “como utilizar o dedo indicador” é saber o bastante. “Ele sempre age assim”, “Ela deveria se encontrar antes de fazer essas coisas”, “Você viu que ele fez exatamente o que disse que não faria?”, “Ela nunca toma boas decisões!”...

Os amigos também falaram. Disseram de maneira sutil, mas quiserem dizer o mesmo: que um erro fora cometido. “Você errou”.

É engraçado como as palavras “sempre” e “nunca” costumam aparecer nos discursos de quem fala sobre alguém. E, às vezes, de quem fala sobre si mesmo. Mais engraçado é como a gente parece saber “A Resposta” – o que deveria ter sido feito, o que daria melhores resultados, o que significa agir deste ou de outro jeito, como seria mais plausível que alguém (ou a gente) tivesse adotado uma postura diferente, e às vezes o diferente tem uma só vírgula de distinção do que, de fato, houvera.

Como a gente parece saber o que é certo e errado a se fazer.

Digamos que se saiba, de fato, que atitudes são certas e erradas... Estive me perguntando o que me faz sentir que posso falar deste Outro, que não conheço além do que me mostra, com tal propriedade que, diante de suas atitudes, reconheço-me no direito de dizê-lo A Verdade: que ele não sabe o que é melhor para ele mesmo. Presumir que sei o que se deve ser feito é imediatamente concluir que todos os outros (ou, no mínimo, boa parte deles) não sabem. Afinal, reconhecendo que temos maneiras distintas de pensar um mesmo assunto, jamais caminharíamos pela mesma estrada – ainda que, por vezes, chegássemos ao mesmo ponto final ou nos cruzássemos no meio do caminho.

Agora vamos pressupor que cada um desenvolve seus próprios conceitos de certo e errado e, embora acredite neles, não estende sua crença aos outros ao ponto de criticá-los caso discordem entre si. Quando considero que errei, por que todos me ensinam a me martirizar por meus erros, como se isto fizesse de mim um monstro?

Eu não sou um monstro.

E eu erro.

Perceber meus erros me torna humana. Refletir acerca de suas implicações em minha vida (e na de outros) me torna ainda mais humana. Repensar minhas posturas diante do mundo me faz sentir o ser humano que eu sempre quis ser.

Mas nem sempre eu percebo. Às vezes eu me recuso a refletir. Repensar pode parecer, muitas vezes, a última das coisas que eu quero e/ou preciso fazer. Sou imperfeita.

Poucas foram as vezes em que chegaram pra mim e disseram: “eu cometi um erro”. Poucas vezes eu o disse em voz alta. Mas consigo me lembrar de várias vezes em que eu e/ou outras pessoas nos posicionamos diante de outros e, mais vezes ainda, a respeito de outros, simplesmente para apontar o que consideramos ter sido um equívoco, pouco empáticos.

Nós erramos.

Eu erro.

O que me intriga é que eu me coloque em posição de criticidade constante a respeito das atitudes de outras pessoas e, quando se trata de mim, que eu ou deixe passar sem reflexão boa parte do que eu poderia ter feito de melhor ou me cobre demais sobre as posturas adotadas.

Cheguei à conclusão, diante de meus devaneios desorganizados, que a gente precisa respirar mais devagar e encarar tudo com menos seriedade. Que eu preciso respirar devagar e oferecer (a mim e a quem me cerca) um pouco mais de leveza. Defeitos sempre teremos, equívoco é até saudável que a gente permaneça cometendo, mas extrair de cada vivência o máximo de consciência que se puder é um desafio que eu quero travar comigo mesma. Já consigo imaginar a quantidade de coisas lindas que posso colher na minha vida se, ao invés de procurar saber, eu procurar me conscientizar – e, num processo todo meu de abertura, passar a compreender mais do que explicar.

Sim, eu erro. Não sou um monstro, sou imperfeita. Quero continuar imperfeita e sentir que, em cada deslize, eu sou capaz de reconhecer menos verdades e mais do Outro, mais de mim, do mundo. Que, a cada voo ocasionando quedas, eu possa aprender a cuidar melhor de meus arranhões e oferecer a mão aos que também estiverem machucados. Que haja sangue pulsando em cada ferida, sinceridade nas lágrimas de cada choro, compreensão nas incoerências de cada uma de minhas dores e honestidade em todas as minhas fraquezas. Apesar dos mantos que nos cobrem ensinando a máscara da fortaleza, quero mergulhar na água límpida que lava as certezas e me recobre de dúvidas.


Imperfeita, eu sou mais humana. Humana, eu sou mais de quem eu sempre quis ser. Sim, eu erro. Quem eu quero ser também erra. Mas não, eu não sou monstro algum.