Sou contraditória em tudo que sou. Alcanço ambas as extremidades, mas me recuso a intermediar. Não nasci para o equilíbrio: sou inteira exageros. Os excessos que fazem de mim meu verdadeiro eu. É a falta de controle que me deixa livre justamente para me libertar.
A confusão que se remexe em mim é meu caminho à autocompreensão. Organização me bagunça. Preciso do desposicionado para me encontrar em minha verdade. Com o que todos não compreendem, eu me identifico e à sua complexidade me entrego. Sou entrega.
Não sei ser o que é e sempre será. Sou o constantemente mutável e irregular, a mudança, a verdade do efêmero, a incerteza do eterno, o falso da ilusão. Não sei ser o determinado, as regras, os valores sociais, aquilo em que todos se encaixam. Sou demais divergente, de diversas formas incoerente, para me dispor ao que se vê. Não sou o visto.
Sou o acanhado e o espontâneo, o incontrolável que em algum momento se retém, o falante que cala, o disperso que atenta, a dor em que se banqueteia. Sou tudo o que não sabem que sou, sou pouco do que julgam que eu seja. Mas sou. A certeza é que sou.
E de onde vem essa sensação de ser? Esse sentido de existir? Essa verdade em respirar? A certeza é que sou. Sei que sou, mas não sei como trançar o intrínseco nem como desvelar o não revelado.
Sou contraditória em tudo que vivo. Sou o oposto do que me é e a essência do que não sei que sou. Sou confusão que não se compreende senão ao não ser compreendida. Sou o nada que não se enxerga e o tudo que pensam ver. A certeza é que sou, todo o resto pode não ser mais.