terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Nua

Estou num desses raros momentos da vida em que não sinto medo, nem tristeza, nem raiva, nem pressa. É como finalmente aceitar-se flutuando na superfície do mar, ciente de que a correnteza é mais forte que seus esforços para alcançar a extremidade oposta e quase gostar desta repentinamente compreendida como falta de direção. Até por sabê-la incompleta, por reconhecê-la momentânea, por captá-la como é: repentina, mas também efêmera.  

Sem pressa. Não quero correr e encontrar logo um caminho para seguir, ainda que por vezes seja inquietante deixar-se levar. É o seguinte: estou seguindo – e isto basta.

Parece até que afundei meus dedos na areia ao entardecer esperando que as águas viessem até mim e percebi que, apesar de me aprazer na aconchegante sensação de estar fincada em algum lugar, eu posso cuidadosamente ir em direção às ondas e lavar os meus próprios pés. Sozinha e solitária, plena de mim mesma. E apreciar os ventos que bagunçam os fios de meu cabelo, jogando-os à frente de meu rosto, sem que me incomode. E mergulhar despida no mar, roçando minha nudez no sal dissolvido da imensidão, sem que isto me doa – ou que me doa, mas que eu saiba reconhecer a dor e vivê-la em seu âmago, inteira.

Eu não mais reconheço o que me tomou a liberdade. Só pareço perceber o quanto quero este abandono – quero, quero, quero (e é só neste momento em que o medo brota dentro de mim: agüentarei?).

Acho que perdi muito neste encontro com o mar. Por isso me sinto leve. É por tanto que meus olhos quase dizem: leve-me. Leve-me, leve. Sem medo, tristeza, raiva ou pressa. Quero mergulhar, quero afogar a mim mesma neste... Shh, e só atenta, é agora! As onomatopéias deste mergulho se professam:

Um comentário:

Matheus Rocha disse...

Pungente, um texto com ares de fim de tarde. Nas ondas, sem pressa, o vai e vem que consola essa brincadeira de ser e não-ser.