Estou num desses raros momentos da vida em que não sinto
medo, nem tristeza, nem raiva, nem pressa. É como finalmente aceitar-se
flutuando na superfície do mar, ciente de que a correnteza é mais forte que
seus esforços para alcançar a extremidade oposta e quase gostar desta
repentinamente compreendida como falta de direção. Até por sabê-la incompleta,
por reconhecê-la momentânea, por captá-la como é: repentina, mas também
efêmera.
Sem pressa. Não quero correr e encontrar logo um caminho
para seguir, ainda que por vezes seja inquietante deixar-se levar. É o
seguinte: estou seguindo – e isto basta.
Parece até que afundei meus dedos na areia ao entardecer
esperando que as águas viessem até mim e percebi que, apesar de me aprazer na
aconchegante sensação de estar fincada em algum lugar, eu posso cuidadosamente
ir em direção às ondas e lavar os meus próprios pés. Sozinha e solitária, plena
de mim mesma. E apreciar os ventos que bagunçam os fios de meu cabelo,
jogando-os à frente de meu rosto, sem que me incomode. E mergulhar despida no
mar, roçando minha nudez no sal dissolvido da imensidão, sem que isto me doa –
ou que me doa, mas que eu saiba reconhecer a dor e vivê-la em seu âmago,
inteira.
Eu não mais reconheço o que me tomou a liberdade. Só pareço
perceber o quanto quero este abandono – quero, quero, quero (e é só neste
momento em que o medo brota dentro de mim: agüentarei?).
Acho que perdi muito neste encontro com o mar. Por isso me
sinto leve. É por tanto que meus olhos quase dizem: leve-me. Leve-me, leve. Sem
medo, tristeza, raiva ou pressa. Quero mergulhar, quero afogar a mim mesma
neste... Shh, e só atenta, é agora! As onomatopéias deste mergulho se
professam:
Um comentário:
Pungente, um texto com ares de fim de tarde. Nas ondas, sem pressa, o vai e vem que consola essa brincadeira de ser e não-ser.
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